Primeiro, mudou minha vida pessoal. Um belo dia fui a uma terapeuta para arrumar um pedaço antigo de uma memória que me incomodava. Como não tinha muitas opções de terapia (alcançáveis ao meu bolso, já que à época morava nos EUA), marquei hora com quem pude. Foi uma pessoa sensível e conhecedora do Tratamento de Memórias Traumáticas por Meio de Estimulação Bilateral do Cérebro (EMDR). Passou-me um monte coisas para ler, sabendo que eu também era terapeuta. Saí daquela sessão sabendo que algo dentro de mim havia mudado para sempre. Só não tinha idéia de que meu rumo profissional mudaria também.
O EMDR representa uma mudança paradigmática na forma de enfocar a psicoterapia. A inventora do método, Dra. Francine Shapiro, comentou há poucos meses no congresso da Associação Internacional de EMDR (EMDRIA), na Filadélfia, Estados Unidos, que o EMDR é uma psicoterapia de base fisiológica (comunicação pessoal em sua plenária, setembro de 2006). Podemos mudar a percepção traumática e as lembranças dolorosas, as imagens, crenças, emoções e sensações ligadas a elas, em um nível neuro-químico, nas redes neuronais do nosso cérebro (sem medicação!).
Atualmente possuímos os instrumentos de medição (SPECT scan, Pet scan, formas de tomografias cerebrais sofisticadas) que comprovam as mudanças na atividade cerebral e formam a base da terapia de reprocessamento. Aquilo que Freud apenas sonhou, hoje podemos concretizar: trabalhamos no ponto de encontro entre mente e cérebro. Finalmente temos as ferramentas que Freud tanto almejou para poder fazer isso.
Quando este sistema fisiológico natural funciona bem, processamos os eventos do dia e arquivamos todo esse material nos nossos imensos bancos de memória cerebral para acesso futuro. Em algumas situações, contudo, quando sofremos experiências traumáticas ou muito dolorosas e difíceis, por alguma razão que não sabemos ainda como explicar completamente, a memória não é processada de forma adaptativa e fica na “tela virtual” do cérebro. É como que se a lembrança ficasse “congelada” no sistema neuro-químico da pessoa, com as imagens, pensamentos, emoções e sensações ligadas àquele trauma. O cérebro se trava e não parece haver jeito de remover essa lembrança perturbadora deste eterno presente e fazê-la virar passado. Tudo que fazemos é distorcido pela percepção daquele(s) trauma(s).
A grande descoberta de Francine Shapiro foi entender que os movimentos oculares bilaterais poderiam “imitar” este sistema de sono REM (processamento) e fazer com que essa memória congelada em um hemisfério cerebral (geralmente o direito) poderia ter acesso às ferramentas que podem processar a carga negativa ligada ao trauma e ajudá-lo a atribuir um novo significado, novo sentido, nova percepção àquilo que foi vivido. As ferramentas (que costumam estar no hemisfério esquerdo) finalmente conseguem chegar ao trauma congelado no hemisfério direito.
Por meio dessa comunicação “de arranque” entre os dois hemisférios, novas redes neuronais são formadas em nível fisiológico, o que permite uma ampla re-significação do evento passado. Em outras palavras, essa integração de informações permite que experiências traumáticas do passado finalmente fiquem no passado e deixem de nos atormentar no presente. (Quem nunca ouviu paciente contar estórias antigas e chorar como se tivessem acontecido ontem? Isso é história passada que fica sempre presente.)
Finalmente, o EMDR tem sido reconhecido oficialmente pela Associação Americana de Psiquiatria como um dos principais métodos eficazes para o tratamento de Transtorno de Estresse Pós-Ttraumático (TEPT). Outros órgãos significativos nos EUA estão seguindo os passos desse reconhecimento. Isso se deve em grande parte à constante insistência da Dra. Shapiro no desenvolvimento de pesquisas com metodologia científica rigorosa. Este é o principal motivo pelo qual o EMDR tem recebido gradativo reconhecimento no âmbito cientifico. Cada vez mais se vêem novas aplicações do método, tais como o combate a crises de pânico, dor crônica, transtornos de ansiedade, doenças psicossomáticas e auto-imunes, bem como outras aplicações preventivas: instalação de recursos e o desenvolvimento do desempenho ótimo.
Mesmo se eu não soubesse de tudo o que sei dos bastidores: como o EMDR funciona, a multiplicação de pesquisas científicas, o protocolo específico – reconheço como ser humano, que o EMDR mudou minha vida definitivamente e hoje vivo experiências sem ansiedade e sem estresse, com uma qualidade de vida que eu jamais sonhei ser possível.
Esly Regina Souza de Carvalho, MSc, LPC, TEP Psicóloga e Psicoterapeuta
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